É ingenuidade fingirmos que existe uma solução mágica para superarmos a primeira crise global ou pensarmos que existe uma saída fácil, já que todos nós estamos convivendo com a incerteza. A avaliação é do professor Panos Vostanis, da University of Leicester United Kingdom, que participou do X Simpósio Internacional de Prevenção do Suicídio, promovido pelo CVV. Nesta conjuntura, se lançarmos um olhar para além das diferenças culturais e socioeconômicas que os jovens e crianças vivem, observaremos que os mecanismos que os afetam são os mesmos. Com isso, analisa, as intervenções e os princípios para buscar soluções também serão os mesmos para todos os jovens. Panos relata que há condições de que surjam diversas soluções e opções para 2021, que será o ano mais desafiador da crise.
Se estimarmos as diferentes formas pelas quais os jovens estão sendo afetados pela pandemia, algumas podem ser mais fáceis de lidar. Porém, podem existir diversos tipos de experiências traumáticas coletivas. Quando os adolescentes são expostos diretamente a esse tipo de catástrofe, que gera perda, assim como os adultos, eles ficam apavorados pois também fazem parte desse fluxo. As respostas rápidas a intervenções diretas são importantes.
No entanto, o professor lembra que existirão também as consequências secundárias. Com o fechamento das escolas, os jovens são privados de sua rotina, da sua rede de proteção e de relacionamentos interpessoais. Logo, o que o professor Panos mais tem ouvido ao redor do mundo é: “Isso é o que afeta mais as pessoas jovens”. De certo modo, na primeira fase do confinamento todos estavam lutando por sobrevivência, porém agora constata-se que os jovens e adolescentes não podem mais esperar para sair. Mesmo que isso não seja possível no momento, é o que eles sentem ser mais angustiante.
É fato que as interações sociais passaram por mudanças, não importa para onde caminharemos, nossos comportamentos estão mudando como nunca vimos antes. Para as pessoas jovens, algo crucial para o desenvolvimento é ter a consciência da existência do próximo, seus amigos, seus grupos. A recessão econômica prolongada, provocada pela pandemia, também pode deixar suas marcas e alguns serão impactados mais fortemente do que os outros. Quando a situação financeira começa a afetar seus pais, isso torna-se uma nova ansiedade, que pode se apresentar de forma explícita ou implicitamente, ainda mais em comunidades desprivilegiadas.
Vulneráveis
Em tempos de risco, de falta de serviços e ajuda, muitos já são os que necessitam de suporte e vão sair ainda mais vulneráveis desse período prolongado de crise. Para o professor Panos, o ponto mais impactante da pandemia é que para essa geração, e até mesmo para as futuras, essa é a primeira vez que suas emoções, suas seguranças internas, são desafiadas. O mundo que elas conheciam entrou em colapso e nunca mais será o mesmo.
Por outro lado, pessoas jovens são mais criativas, têm maior capacidade de se adaptar. Panos Vostanis acredita que este deve ser o foco. Assim, podemos esperar um efeito agudo de qualquer experiencia traumática, sendo o coronavirus uma delas, quando as pessoas estão lutando para sobreviver, seus mecanismos de defesa estão elevados, portanto, é “normal” que surjam desde sintomas de distúrbios no sono, até outros distúrbios de saúde mental, particularmente a depressão.
Outra característica particular, que é bastante incomum, é que apesar de os menos favorecidos serem os mais afetados, ninguém está imune à crise. Perdas, medos e inseguranças atingem a todos. Sendo assim, professores, terapeutas, cuidadores e voluntários não podem se distanciar dessa angústia das pessoas mais novas, como talvez tenha acontecido em outras situações.
Profissionais de saúde
Em um estudo feito na Faixa de Gaza, no território palestino, foi descoberto que obviamente os profissionais de saúde são afetados, tinham altas taxas de distúrbio de estresse pós-traumático, porém o que antevia esse distúrbio não eram as experiencias profissionais, mas sim suas perdas pessoais. Aquilo que vivenciaram como cidadãos, perdendo seus próprios amigos, parentes e testemunhando violência como civis.
Não existem soluções óbvias para esta crise, porém existem princípios do que se deve fazer daqui pra frente. Em primeiro lugar, Panos aponta que se deve tentar construir uma resistência sistêmica ao redor de pessoas jovens, especificamente através de escolas; lá no Reino Unido, o trabalho com professores, sistemas e toda a escola pode ser bastante importante, pois o próximo passo seria criar para crianças e adolescentes um senso de normalidade.
Criatividade
Outro ponto importante, até mesmo para crianças jovens é que se deve deixar que elas participem ativamente da construção dessa normalidade, deve-se confiar no julgamento e na criatividade delas, reconhecer a situação incomum e ver como elas recriam novas rotinas, sejam elas quais for. Segundo o professor Panos, isso nos trás ao importante ponto de como adultos são afetados e como isso está afetando jovens crianças.
Os dois posicionamentos extremos que se deve evitar são: de negação, ou ser muito otimista, pois isso só deixa os jovens mais inseguros e descontentes. O outro extremo é sobrecarregá-los com nossas próprias ansiedades, pois eles vão se alimentar desse sentimento. A dica é estar sempre aberto ao diálogo, sobre o que sabemos ou não. Panos destaca que desafios trazem oportunidades para se pensar fora da caixa e não há ninguém mais criativo que os jovens, portanto, devemos trazê-los a bordo, nas escolas e em outros espaços comunitários.
André
CVV Caicó/RN