A gente vive numa sociedade barulhenta, cheia de estímulos. A aceleração é tanta que, às vezes, a mensagem no celular, ouvida em velocidade 2, ou um e-mail, por exemplo, substituem o encontro. Escutar parece algo muito natural, mas muitos problemas de comunicação surgem exatamente da dificuldade que às vezes a gente tem de falar e, principalmente, de praticar integralmente esse ato que vai além da simples audição. “O olho no olho, a escuta genuína, o momento de encontro, de escuta e de fala são cada vez mais raros. Então é preciso aproveitá-los. Já que são raros, que sejam de qualidade”, afirma Thomas Brieu, especialista em Escutatória, ao Como Vai Você, programa do CVV.
Hoje, há um excesso de informação, onde todos podem se expressar e gerar conteúdo. Daí surge o desequilíbrio entre a oferta e a escuta de informação. A atenção, avalia Brieu, está sendo o tempo todo hackeada pelas redes sociais, pelas telas, estímulos e notificações. “Escutar melhor é uma decisão. Eu preciso decidir aonde coloco a minha atenção. Ela é um adubo para a qualidade dos meus relacionamentos”. Mais que escutar, é preciso dar provas disso e ter cuidado com o que ele chama de “armadilha da empatia”. “Não se escuta com o corpo fechado. É preciso uma postura física de abertura, com o olhar, com a cabeça, o corpo para a frente. Mas é preciso ter uma postura mental de abertura. Esta postura mental de abertura se chama interesse e curiosidade. Não é curiosidade de bisbilhotar a vida do outro, mas a curiosidade de se interessar pelo outro. E a armadilha da empatia é tentar adivinhar o que o outro sente”.
E por que esse ato se torna uma armadilha? Brieu afirma que, a partir do tentar adivinhar, começam a surgir frases ou pensamentos como “eu entendo você”, “eu sei o que você está passando”, “eu também já passei por isso”... “Embora essas falas tenham uma intenção empática, estamos competindo pela dor, pela emoção do outro, seja ela boa ou ruim. Nestes casos, sobrepomos a nossa história em vez de nos interessar pela história do outro”, explica.
O melhor, segundo ele, é dizer “eu não sei o que você está passando”, “eu não consigo imaginar”. “Escutar é abrir mão do seu ego, porque o teu ego quer subir no palco e quer argumentar, quer interromper o outro. Então, ao escutar, eu decido focar a minha atenção no outro. Eu faço uma suspensão temporária do ego. Eu tenho esta postura de abertura”. Neste cenário, uma questão importante é desenvolver repertório emocional. “Muitas vezes, falamos o que sentimos com o dedo apontado. Eu me sinto injustiçado. Isto não é um sentimento. Em vez de falar estou abandonado, dizer: eu sinto falta de colo”.
Escutar exige treino. Se o corpo e a mente não estão afinados, se o coração não está envolvido, o outro percebe. E, mesmo com muito treino, nem sempre escutamos bem. “Somos todos péssimos na hora de escutar e ainda piores na hora de dar provas da escuta. Então, como saber se estou sendo escutado? Você sente. Eu dou a minha escuta genuína, as minhas provas de escuta e o outro me escuta de volta”. A prova de escuta, conclui ele, é um exercício de presença e de atenção plena. Sem discordar ou interromper.
Leila – CVV – Brasília -DF
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